Uma aula com Leandro Karnal

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Entrevistei o historiador brasileiro, professor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), especialista em história da América e autor de sete livros, Leandro Karnal. Um dos maiores pensadores da atualidade, o historiador pop, com mais de um milhão de seguidores no Facebook, ministra palestras sobre temas como felicidade e liberdade, e escreve ainda uma coluna no jornal O Estado de São Paulo. Acompanhe, a seguir, alguns trechos do nosso bate-papo, que foi uma verdadeira aula.

O que é a fama para você?
A fama, essa deusa alada do mundo clássico, é algo que reforça o ato do mérito. Então, Alexandre o Grande conquistou todo o império Persa. Alexandre é famoso. O que existe hoje é que a fama dispensa o mérito. Ela existe independentemente da ação. Ela é o objetivo em si. Para dar um exemplo cômico que aconteceu comigo, estava em um avião e muitos me pediram para tirar foto comigo. A mulher a meu lado também pediu, e eu disse – claro, e perguntei se ela gostava da minha obra e ela responde – não, não sei quem o senhor é, mas todo mundo está tirando foto… risos. Ou seja, não importa o que eu sou ou fiz, mas se os outros acham importante, ela faz o registro.

O que é felicidade, nos dias de hoje?
O primeiro argumento para saber se sou feliz é o mesmo utilizado para saber se sou alto, magro, bonito ou feio; eu preciso me comparar com alguém. Ao me comparar, vou estabelecendo o seguinte: eu não tive felicidade, agora eu tenho. A felicidade completa vem após uma infelicidade. Todo casal sabe que o encontro erótico mais intenso se dá após uma briga. Felicidade é a percepção de um momento; não é, e nem nunca será, um ato permanente. O que é particularmente terrível hoje é a propaganda da felicidade, porque ela tem de ser permanente. Então você posta fotos da sua família perfeita, das suas férias extraordinárias, das suas refeições incríveis e esquece que, no dia a dia, come no “por quilo” e que seu filho o enlouquece. Começa a acreditar que o sentido da vida é a propaganda da felicidade, e esquece que a moldura trágica, que é a dor, é o que dá sentido à felicidade.

Paixão é tesão?
Paixão é uma infecção passageira curada pelo tempo. É uma perversão do amor, porque ela, na verdade, faz com que você veja seu entusiasmo como dirigido ao outro. Amor pressupõe anos de relação. Buscar paixão é como ser viciado em opiáceo. A paixão tem de ser apenas o preâmbulo de uma relação adulta, chamada amor.

Hoje muitos o seguem, vão às suas palestras e o têm como um guru. Como fica o seu ego?
Ser exposto ao público é virar para-raios de toda espécie de sentimento. Há muitas coisas boas que aprendi e de que gosto, mas é impossível fazer sucesso sem os haters, os odiadores profissionais. Tem um senhor que acho extraordinário. Ele me escreve toda semana – leio suas duas crônicas do Estadão, li seu último livro, acompanho seu canal no YouTube e odeio tudo o que você diz. (risos).

Como vê essa vaidade, essa superexposição na internet?
Do ponto de vista psicanalítico, vemos que as pessoas estão muito narcisistas, muito focadas no orgulho, por isso falam tanto de si. Mas também posso pensar de outra forma. Os indivíduos estão tão enfraquecidos que precisam que os outros digam que a vida delas é válida. Então, postam viagens para que todos vejam que têm uma vida muito legal e assim a validem.

Qual o mal que a internet pode causar?
Toda tecnologia contém seu reverso. Você tem de dizer a seu celular quem é quem manda. Usá-lo ao invés de ser usado. O principal defeito é pensar que, deixando de registrar algo, eu não terei vivido; deixando a tecnologia o dominar.