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Com muitas décadas jogando e escrevendo sobre golfe, recorrentemente me perguntam, qual foi a minha melhor partida que eu joguei na minha vida? Antes de falar sobre a melhor partida, posso garantir que sei muito bem qual foi o melhor mês de golfe de minha vida, maio de 2015, quando joguei um mês inteiro quase todos os dias e em campos maravilhosos em Portugal e na Escócia.
Lembrei também de um torneio que ganhei como scratch, sob pressão máxima de minha mulher, uma vez que o primeiro lugar ganharia um vaso da famosa marca Bulgari. Ela foi muito convincente ao dizer, caso eu não ganhasse, que eu teria de comprar um idêntico para ela. Melhorou muito meu swing e meus putters, ao saber que o preço do vaso poderia alcançar 5 dígitos em dólares. Mas vamos à história da melhor partida de minha vida, que pouco tem a ver com o resultado, e sim o trabalho e o prazer que ela me proporcionou.
Desafiei dois grandes amigos, que como eu, já eram seniores, tendo eu 60 anos e eles na faixa de 55 anos, mas muito melhores física e tecnicamente que eu. Meus amigos com handicap 2 e 6, e eu já com dificuldade de jogar 12 de handicap. Não vou dar maiores informações para ninguém os identificar, pois no cenário nacional eles são muito conhecidos.
Provoquei-os ao extremo, para ver se eu conseguia uma vantagem maior (Strokes), que eles tinham que me dar pela regra oficial do golfe, mas como cobras criadas, nenhum dos dois caiu na minha conversa mole. Mesmo assim consegui, pelo menos, escolher o campo que eu queria e a modalidade do jogo. Apesar de eles serem muito bons jogadores, jogar no meu campo preferido em que eu jogo 80% dos meus jogos, e eles menos de 5% das vezes, já ajudou um pouco na estratégia.
E como economista de profissão, que gosta de matemática e de probabilidade, optei pelo jogo por buracos (match play), que perdoa os desvios de padrão do handicap mais alto e depois de analisar diversas partidas que tinha feito naquele campo. Descobri quais eram os meus 6 buracos de melhor desempenho e os 6 de piores desempenhos, os seis restantes deixei um pouco de lado na estratégia de jogo. Recebendo 10 strokes de vantagem do de handicap 2 e 6 strokes do outro parceiro, passei a analisar como eu deveria me comportar e quais cuidados eu devia tomar, me arriscando ou sendo conservador buraco a buraco.
Preciso deixar claro que jamais contei para eles ou qualquer outro golfista, e só agora resolvi escrever e publicar, pois já se passaram 15 anos. Mas vamos voltar ao jogo, que foi marcado para uma sexta-feira, bem cedo, saída as 8:00 h, pois eu sabia que um deles não gostava de jogar muito cedo e o outro sim. E cada pequena vantagem que eu conseguisse iria afetar o resultado. Na noite anterior ao jogo passei horas revisando minha estratégia, e cheguei à conclusão de que a melhor possibilidade seria eu imaginar estar jogando contra um handicap 4 (a média entre os handicaps dos meus oponentes), mas isto apontava uma possibilidade real de perder uns 8 buracos.
Convenci ambos a sairmos pela volta mais difícil do campo, se não era fácil para mim um local player, seria mais difícil para eles em função de pouco conhecer o campo. Acabamos os primeiros nove buracos, onde consegui empatar com o handicap 6 e ganhar de 1 do handicap mais baixo, que tentou no par 5 chegar em duas no green e se deu mal. Paramos no bar para tomar uns refrescos e comer alguma coisa, antes de começar a segunda volta. Mas tive tempo suficiente para rever minha estratégia para a segunda volta, a mais fácil do campo. Com ajuda dos meus anjos da guarda e dos deuses do golfe, comecei a segunda fazendo 4 pares seguidos, fato realmente raro, que fez eu estar ganhando de 1 do melhor jogador e 2 do jogador de handicap 6, que baixou bem seu desempenho.
No buraco 14, um daqueles que pelas estatísticas eu tinha pior desempenho, joguei com o livro de regras debaixo do braço, como se eu fosse um handicap 18, porque eu tinha vantagens dos dois. Saí de madeira 3, para espanto dos meus adversários, com o objetivo de ficar feliz fazendo um boogie. E como os dois fizeram par, saí do buraco com um empate muito bom. Joguei o buraco 15, um par cinco, onde eu não tinha nenhuma vantagem, agressivamente por ser um dos buracos que eu mais gostava e que tinha o melhor desempenho.
Fiz um birdie espetacular, que me fez empatar com o handicap 2, que fez um birdie relativamente tranquilo e ganhar do handicap 6. Entrei para o buraco 16, com o de handicap maior “dormie”, isto é, ele não tinha mais chances de ganhar de mim, só no máximo empatar.
E ganhando de 1 buraco do melhor jogador. Como era o último buraco que eu tinha vantagem dos dois, joguei conservadoramente, para fazer no máximo um boogie, bati do tee de saída minha madeira 3 no meio da raia, e acabei ficando mais de 70 jardas atrás dos dois, e a 230 jardas da bandeira. Fui o primeiro a dar a segunda tacada, de novo uma madeira 3 e coloquei na banca a direita muito perto da bandeira que estava no início do green. Os dois craques batendo ferro 9 um e pitch o outro, ambos deixaram a bola no green, o melhor deixou a bola umas 7 jardas da bandeira e o outro 12 jardas.
Exigi que o que estava a 12 jardas jogasse primeiro, pelas regras do golfe, uma vez que a minha bola apesar de estar na banca estava mais ou menos 10 jardas. Ele tentou embocar, mas a bola ficou quase pendurada no buraco, o que fez ele fazer o par. Como um excelente jogador de banca não tive dificuldade em deixar a bola há uns 30 centímetros da bandeira, o que os dois tremendos cavalheiros e amantes do golfe, declararam que minha bola estava dada.
Fiquei com um pouco de taquicardia esperando o melhor jogador bater seu putter, que para minha sorte deixou a bola há um centímetro do buraco e acabou fazendo um par também. No tee do 17, um par 3 relativamente longo, eu estava com o jogo ganho do handicap 6 e com 2 buracos de vantagem sobre o handicap 2, portanto, também “dormie” com ele. Nem nos meus melhores sonhos eu imaginei ter esta vantagem no buraco 17. Mas agora eu não tinha mais strokes (vantagens) de ninguém, e meu jogo agora era enfrentar o melhor jogador e tentar empatar 1 buraco dos dois restantes.
Como nada nunca foi extremamente fácil na minha vida, errei o green e cai num lugar na banca frontal, quase que impossível de sair. Os dois puseram no green fizeram par e eu lutando muito fiz boogie e perdi para os dois. Chegou finalmente o buraco 18, eu com a firme missão de tentar arrancar um empate com o melhor, tarefa não muito fácil, pois pensei comigo, nem se fizer o par estou garantido, pela alta qualidade do meu oponente. Mas eu não havia percebido que ele ficara irritado por não ter feito o birdie no buraco anterior. Como ele tinha a primazia de sair primeiro, fiquei de lado respirando fundo para ao chegar minha vez poder dar um bom drive. Ele que normalmente alcança 300 jardas no seu drive, tentou forçar ainda mais, levando a dar uma cortada (slice) jogando a bola fora do campo (out of bounds). Mesmo não sendo usual, ele pediu para bater uma segunda bola em seguida, e nós vendo o estado de irritação do amigo, concedemos sem qualquer comentário. Ele bateu um segundo drive, terceira tacada, e a bola passou das 320 jardas, ficando muito próximo do green que era um par 4.
Chegando minha vez de bater o drive, me preocupei em fazer um swing muito leve para colocar a bola no meio da raia. Ele estava quase 100 jardas à minha frente, mas com 3 tacadas, o que me levou a dar um segundo tiro conservador, que alcançou a banca da esquerda do green. O parceiro que já tinha perdido o jogo para mim, jogou a segunda no green para fazer um par fácil.
Eu já achava que tinha ganho o buraco, fiquei assustado, depois que o melhor jogador deixou a bola da 4ª tacada a menos de um metro da bandeira. Como eu precisava de um empate para ganhar o jogo, tirei da banca no melhor estilo de “covarde vivo”, deixando a bola umas cinco ou seis jardas do buraco e dando dois putters empatei o buraco e ganhei o jogo.
No buraco 19, o bar, depois de muitas brincadeiras tradicionais, descobri que minha proeza, que fez bem para a alma, acabou me dando um bom prejuízo, pois ganhei na época o equivalente hoje a 20 dólares e a conta do bar que tive pagar ficou em 75 dólares.
Viva o Golfe