Francisco esteve no Brasil em 2013, durante a Jornada Mundial da Juventude, reunindo milhões de brasileiros no Rio de Janeiro e em Aparecida, interior de São Paulo.
Além de problemas que afetam a comunidade global, como a da migração, que atinge milhões de refugiados de guerras ou de recessões econômicas em busca de melhores condições de vida, o Papa tem discutido abertamente diversos aspectos do comportamento humano atual e demonstrado muita tolerância e coragem; sem, porém, contrariar a doutrina o?cial da Igreja.
Em seu livro Quem sou eu para julgar?, uma reunião de textos sobre os mais diversos assuntos, ele fala sobre os direitos do ser humano e a misericórdia. A linguagem é simples e direta, mas contundente e tocante, e leva à re?exão sobre a relação do homem com Deus e com o outro. Assim, ele toca, por exemplo, no tema do homossexualismo de forma incisiva. “Nós, católicos, devemos acolher o pecador, e não o pecado. Se o homossexual busca a Deus, não o julguemos!”
Ao jornalista italiano Andrea Tornielli, o Papa explicou que o comentário sobre as pessoas gays re?ete o seu projeto de construção de uma Igreja que propaga a misericórdia, não doutrinas.
Mais recentemente, ele pediu que a presença das mulheres fosse ampliada na Igreja. Para Francisco, é necessário “encontrar um espaço mais amplo, coerente com o crescimento da presença feminina nos vários campos de responsabilidade da vida da Igreja em particular, e não apenas no campo cultural”.
Os atos de coragem e desprendimento do Papa remetem lá à escolha de seu nome. Ele adotou o nome pensando em São Francisco de Assis, santo dos pobres e da defesa da ecologia. A sugestão foi dada a Bergoglio pelo seu colega brasileiro, o cardeal emérito de São Paulo, Dom Claudio Hummes, com um pedido de que não se esquecesse dos pobres.
Da mesma maneira, o Papa Francisco quer acolher a todos os que buscam a Deus. Publicou uma encíclica sobre ecologia e, de certa maneira, tem reconstruído a Igreja. Padre Joãozinho, da Congregação dos Sacerdotes do Sagrado Coração de Jesus, teve a missão de traduzir o último livro do Papa Francisco – Deus é Jovem – para o português. Ele conheceu o Papa quando este era ainda o arcebispo de Buenos Aires.
“Conhecendo Dom Bergoglio, um homem combativo, jesuíta, minha primeira impressão foi a de que seria um Papa ‘linha dura’, mas, aos poucos, aquele homem cheio de vigor foi mostrando que também tinha ternura”, disse em entrevista o padre. “Certamente isso foi uma graça de estado que ele recebeu. Porque, antes, ele era o terror dos jornalistas, e depois se tornou praticamente um homem fotogênico. Não se trata de populismo, pois ele pediu isso a Deus quando se tornou Papa”.
De fato, em apenas cinco anos, o Papa surpreendeu a todos com a sua revolução da ternura. “Em um mundo no qual a economia parece se importar mais com as coisas do que com as pessoas, a revolução da ternura é necessária para colocar o ser humano novamente no centro”, destacou Francisco em mensagem aos participantes do TED 2017, um fórum de ideias que reuniu personalidades de várias áreas, em Vancouver, Canadá. Na comunicação, o Papa recordou ainda a ideia de que a pessoa “não é uma ilha isolada” e a “felicidade se faz com os outros”.
Em 2013, a revista norte-americana Time o escolheu como a Personalidade do Ano. De acordo com o periódico, Francisco, o primeiro latino-americano a comandar a Igreja Católica, “tirou o papado do palácio para levá-lo às ruas” e “se colocou no centro das discussões-chave”.
Francisco derrubou mesmo muitos muros para se tornar o Papa do povo e, principalmente, se tornar o Papa que desceu do trono, não só por, logo ao assumir o ponti?cado, despir-se de todas as pompas do cargo, abandonando o anel de Papa, a cruz dourada e as vestes imponentes. Mas, sobretudo, por se colocar perto dos mais humildes e pregar isso para toda a igreja.
A moradora de Alphaville, Maria Auxiliadora Madio Pereira (Dora), teve o privilégio de participar de uma audiência com Francisco, em 2014. Ela lembra com muita emoção do encontro. “Ele me surpreendeu pela humildade, quebrando todos os protocolos para mostrar que temos de ser cristãos no dia a dia”, conta, lembrando que havia muitos jovens assistindo à audiência e o Papa tirou o boné de um deles e colocou em sua cabeça. “Ele se fez um de nós. Mas o que queria era nos incentivar a não diferenciar as pessoas.”
Outro morador de Alphaville, teólogo, que conhece bem a doutrina social da Igreja e admira as atitudes de Francisco, é Celso Tracco. “Pelos documentos que escreveu, percebemos que é um Papa que evangeliza e educa a todos, não só aos católicos”, diz Tracco. “Francisco mudou a cúpula do Banco do Vaticano, para que a instituição ?nanceira custeie as ações missionárias. Ele não se deixa parar e está mudando a Cúria Romana para mudar a Igreja no mundo”.
Em seus pronunciamentos e escritos, o Papa Francisco usa sempre expressões muito marcantes para comunicar com profundidade sua mensagem. É, sem dúvida, um peregrino da paz, como já foi chamado, mas também um incômodo provocador que, frequentemente, leva os cristãos à re?exão sobre os que se encontram às margens da sociedade, sobre a igreja e a própria família – a respeito da qual já disse: “a família perfeita não existe, nem há um marido perfeito nem uma esposa perfeita, e não falemos sobre a mãe perfeita! Somos todos pecadores”.
Após cinco anos, há ainda uma lista enorme de questões que o Papa precisa enfrentar diariamente, dentro e fora da Igreja. Até aqui, porém, Francisco revigorou a Igreja, “que espalha a boa nova de Jesus por meio do encontro, do diálogo e do testemunho”, como analisou o vaticanista Joshua J. McElwee, autor de livros sobre o pontí?ce. No cenário global, publicou, em 2015, a encíclica Laudato Si – a primeira da história a trazer o meio ambiente como tema principal; tem falado constantemente sobre o acolhimento aos imigrantes (construir pontes, e não muros); foi responsável pelo reatamento diplomático entre Cuba e os Estados Unidos e de tantas outras ações para promover o bem-estar e a paz.
Na visão de Padre Joãozinho, os anos futuros de ponti?cado certamente trarão surpresas. “O Papa Francisco se reinventa. Está propondo ao mundo uma revolução da ternura. Para mim, os próximos anos vão nos surpreender, porque ele é um homem guiado por Deus, é um profeta, um sonhador.” Com certeza, embaixo de São José dormindo, Francisco deve colocar um bilhetinho para 2019, pedindo força e clareza para continuar essa grande caminhada em busca da paz entre os povos e seguir na luta contra a miséria e as injustiças. Mas, como ele mesmo tem dito: “o futuro está, sobretudo, nas mãos das pessoas que reconhecem o outro como um ‘tu’, e a ‘si’ mesmo como parte de um ‘nós’”.
As impressões do padre Antônio Maria
Ainda que autor de vários livros, o padre Antonio Maria é mais conhecido por suas gravações musicais. Certa vez contou que, quando jovem, queria ser cantor e preferia essa carreira ao sacerdócio. No ?m, “tudo deu certo e as duas vontades se concretizaram e se complementaram”, comenta. Foi justamente essa paixão pela música que o levou a fazer parcerias musicais e amizade com muitos artistas, entre eles Roberto Carlos. Aqui, com exclusividade, padre Antonio Maria conta uma passagem sobre o pontí?ce: “Vibrei quando vi que o novo Papa era latino-americano e ?quei mais entusiasmado ainda quando ouvi o nome que escolheu. Suas palavras demonstraram uma profunda humildade e o gesto de pedir, inclinando-se, que rezássemos por ele, que o abençoássemos, antes de ele nos abençoar. Francisco é muito pessoal e simples. Num encontro que tive com ele, pedi que abençoasse um tercinho para Roberto Carlos, o cantor, que faria aniversário naqueles dias, e eu queria presenteá-lo. Ao ouvir o nome do ‘rei’, entusiasmou-se e disse: ‘Claro, claro, con mucho gusto!’ E ao me despedir dele, puxou-me pelo braço e disse: ‘Não te esqueças de dar-lhe um abraço por mim”.
A principal missão do Papa é ser pai da Igreja e, de um certo modo, do mundo todo. A palavra Papa nos lembra disso. Para nós, católicos, ele é o sucessor de Pedro e tem a missão de nos con?rmar na fé, por palavras e exemplos, como Jesus pediu a Pedro, em Lucas 22,32: ‘Mas eu roguei por ti para que tua con?ança não desfaleça; e tu, por tua vez, con?rma os teus irmãos’.
O Papa Francisco é um líder nato. Como São Francisco, evangeliza mais pelo exemplo do que pela palavra, mas sua palavra é também um grande presente para nós, pois ele tem um jeito peculiar de falar. É simples, pessoal, sem rodeios. Não usa o plural majestático e fala de maneira a ser compreendido por todos. Palavras bem populares fazem parte de seu vocabulário, como por exemplo, quando se refere a palavra fofoca, ele diz: ‘quem fofoca é terrorista; a fofoca é uma bomba, tem efeitos desastrosos’.
O Papa reformador e ecumênico
Francisco tem apreço pela nova geração de evangélicos. É interessante observar que o Papa tem mantido relações cordiais com os líderes das denominações protestantes tradicionais, como Justin Welby, arcebispo de Canterbury, e quando se reúne com seus amigos evangélicos, ele os convida para o café da manhã ou para o almoço e passa horas conversando, rindo e desfrutando da comunhão com eles.
A relação com os evangélicos pode ser chamada de ‘coração’ da reforma de Francisco. A reforma que ele planeja é muito mais radical do que isso. Ele quer que os católicos sigam Jesus Cristo de maneira radical, alegre e capaz de fazer a terra tremer. Prova disso é sua relação também com os muçulmanos. Ele condena a perseguição da minoria muçulmana Rohingya, em Myanmar, sul da Ásia. Também disse que reza para que eles tenham “direitos completos”, aproveitando para pedir que os ?éis também rezem para que eles recebam ajuda.
TRAJETÓRIA DE FRANCISCO
O cardeal Jorge Mario Bergoglio, o Papa Francisco, nasceu em 17 de novembro de 1936, em Buenos Aires, na Argentina. Veio de uma família de imigrantes italianos de Gênova. Formou-se em Química na Universidade de Buenos Aires. Ainda jovem, teve um problema respiratório que o levou a perder um pulmão.
Não obstante, Bergoglio entrou para a Companhia de Jesus, onde fez o noviciado em março de 1958 e o Juniorato em Santiago do Chile. Ao concluir a Teologia, recebeu a ordenação sacerdotal em 13 de dezembro de 1969. Francisco é o primeiro Papa jesuíta.
Com a sua ordenação, Bergoglio emitiu seus últimos votos na Companhia de Jesus, em 1973, ano em que foi nomeado Mestre de Noviços, em São Miguel. No mesmo ano, foi eleito Provincial dos Jesuítas, na Argentina.
Em 20 de maio de 1992, foi nomeado Bispo de Auca e auxiliar de Buenos Aires. Em fevereiro de 1998, tornou-se arcebispo de Buenos Aires, sucedendo a Dom Antonio Quarracino. Em fevereiro de 2001, foi instituído Cardeal pelo Papa João Paulo II. Em 2005, tornou-se presidente da Conferência Episcopal da Argentina, cargo que ocupou até 2011.
Papa Francisco foi eleito depois de três dias apenas de conclave, em 13 de março de 2013, após a renúncia do Bento XVI, o que causou um grande desconforto à Igreja Católica. Muitos religiosos viram na atitude de Bento XVI as virtudes de humildade e ao mesmo tempo de coragem; mas o mundo ? cou perplexo e os críticos da Igreja aproveitaram o momento para a? ar ainda mais a língua.
Ao ser eleito, na Capela Sistina, perguntaram a Bergoglio se aceitava. E ele disse: “Eu sou um grande pecador. Mas, con? ando na misericórdia e paciência de Deus, no sofrimento, aceito”.
O nome do escolhido pelos 115 cardeais foi anunciado pelo mais velho dos cardeais-diáconos, o francês Jean-Louis Tauran. A decisão surpreendeu, pois, o argentino não aparecia nas últimas listas de favoritos, que incluíam o brasileiro Dom Odilo Scherer e o italiano Angelo Scola.
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