A História de um sonho adaptado

Reprodução/Internet

Ele quase nasceu num campo de golfe, uma vez que o seu pai foi ser profissional de um clube de apenas 9 buracos, numa cidade do interior. Isto foi no meio da década de 50, quando os efeitos da segunda grande guerra mundial, ainda era latente em todos os lugares, até na cidade que eles foram viver. As preocupações com a escassez de alimentos e empregos era tanta, que não se podia querer algo melhor. Sem falar que na época era muito mais profunda as diferenças socioeconômicas e culturais, o que segregava muito a comunidade onde se vivia. Mas a sua personalidade foi moldada a partir de um pai extremamente conservador e de uma mãe cujo despreparo cultural, inerente a quase todas as mulheres da época, independente da sua condição econômica, era escamoteada pelo enorme coração e pela paixão pelas suas crias. As dificuldades financeiras nunca foram impeditivas de nada, e nem era a preocupação maior da família. Viviam muito bem apesar da escassez financeira, por terem uma mãe extremamente criativa e religiosa, que incrustou, em suas mentes, que era pecado não comer o que se tinha e que a sobremesa de doce uma vez por semana, era uma dádiva divina. Por ser mais velho e acompanhar de perto o pai no campo de golfe e muito cedo ter recebido algumas responsabilidades, que em caso de falha, certamente afetaria toda a família, o nosso escolhido, teve que aprender muito cedo a sonhar acordado. O sonho de se tornar um jogador profissional de golfe, teria que ficar em segundo plano, uma vez que esta realidade estava distante e tinha enorme probabilidade de não dar certo. Isto nunca lhe trouxe   sofrimento algum, uma vez que era adiamento de sonho. Ele descobriu muito cedo as agruras que seu pai enfrentava, para tocar a profissão e cuidar da família, o que em muitos momentos exigiu do pai uma certa condescendência aos seus corretos princípios, que trocando em termos mais populares, “quanto sapo seu pai tinha que engolir, para seguir em frente”. O seu desenvolvimento no golfe foi diminuindo a aceleração, a partir da necessidade de estudar mais afinco e fazer outras tarefas, como dar aulas particulares de matemática, para complementar a renda da família e suas necessidades de adolescente aos 15 anos de idade. Sua visão de mundo parecia muito clara, ao entrar na faculdade com 18 anos, tinha duas coisas que precisava se concentrar ao máximo, seus estudos e arranjar um emprego. Neste momento, o sonho de ser um jogador profissional, já havia esmaecido naturalmente e ser um professor de golfe, não passava em nenhum momento por sua cabeça, pois estava claro que este segmento era para muito poucos e o mercado era inexistente no Brasil. A morte prematura do pai acelerou todo o processo, e fez num piscar de olhos esquecer qualquer possibilidade de se tornar um jogador profissional ou até viver do golfe. Se dedicar 14 horas por dia aos estudos e ao trabalho de segunda a domingo, pareceu ser a única luz no final do túnel. Tudo em sua vida se acelerou numa velocidade incrível, literalmente tudo, trabalho, família, amor, práticas esportivas alternativas ao golfe, sobrava tempo para reclamar ou fazer outros devaneios. Com certeza uma dádiva divina, se enraizou em sua mente, que era a paixão de fazer o que estava fazendo com muita alegria e atenção. Não tinha realmente tempo para fazer conjecturas que o desviasse para outros caminhos. O pragmatismo que sempre foi inerente ao seu ser, desde tenra idade, uma vez que nunca entrou em batalhas que não tivesse chance de ganhar, agora quando se aproxima dos 30 anos de idade, toma proporções muito maiores, pois tinha uma família de mulher e dois filhos e uma família herdade de mãe e três irmãos que não podia abandonar. O sucesso galopou até os 35 anos de idade, de uma forma muito consistente, e sua eterna lutar de conseguir uma poupança para enfrentar dias piores, agora já tinha um pote razoável. Por isto a tempestade que ocorreu nesta idade, que o fez romper uma carreira profissional vitoriosa de 17 anos, não criou um abalo destruidor. Era hora de mudanças radicais acontecer, tomar conta do seu destino a seu modo e prazer, por isto montou uma empresa de consultoria, e foi vender todo o seu enorme aprendizado, façanha que vem fazendo por 38 anos ininterruptos. Passados 15 anos de sucesso na área de consultoria e tendo suas duas famílias bem encaminhadas, era hora de voltar aos seus sonhos do golfe. Obviamente, não lhe passou pela cabeça se tornar professor de golfe ou jogador profissional, esta segunda opção não havia a menor chance técnica de acontecer, era uma probabilidade tendendo a zero mesmo. Mas reescrever seu sonho adaptado, talvez não fosse impossível de ser feito. Pragmático, economista de formação e com um pensamento cartesiano muito aguçado, começou a achar correlações de sua vida e do mundo do golfe. Se ele tivesse alcançado o nível de um profissional do PGA Tour, sua luta anual seria a manutenção do seu “cartão” via o ranking monetário, que ratificou para a temporada seguinte, somente os 125 melhores jogadores no “money list” a cada final de temporada. Ele teve a ousadia ou a pachorra de levantar os dados ano a ano destes 15 anos, referente aos cortes anuais dos 125 jogadores que passaram para a próxima temporada do PGA. Isto deu a ele uma sensação de uma vida vitoriosa, e seu sonho adaptado estava claro, quando ao examinar seus ganhos de 15 anos seguidos, indicava que na vida ele tinha conseguido manter seu cartão. Ele estava entrando no seu período de Senior Tour, com a mesma tranquilidade que muitos grandes jogadores fizeram, a única diferença é que agora ele iria praticar seu esporte predileto por puro diletantismo, sabendo que havia dado certo por um caminho paralelo. O roteiro foi adaptado, mas nem tanto.

Viva o Golfe!